sábado, 7 de abril de 2018

Baralho conta Histórias


Quando o Baralho conta Histórias



por Fellipe Nunes


Clico no botão de time bank para ter alguns segundos a mais para pensar. Estou no river. Será mesmo que ele apostaria três streets com top pair nesse bordo? Devo pagar com meu terceiro par? Quantas e quantas vezes já me encontrei nessa situação durante a carreira.

A leitura de mãos é essencial para jogar no nível dos melhores. Cada ação na mesa é um indício, uma pequena parte de uma história que pode ser curta, se a mão se definir no flop, ou costumeiramente mais longa e complexa, se a mão evoluir até o river.

Porém, antes de buscarmos ler os outros jogadores, é importante termos consciência do que nossas próprias ações revelam e compreender quais histórias criamos. Assim, podemos controlar o que contamos quando continuamos apostando no flop em um bordo A♦2♦7♠, após ter dado raise pré-flop do UTG, e o que contamos quando fazemos o mesmo em um board 7♣6♣4♦.

Na primeira situação, temos normalmente cartas altas e fortes, e nosso range se encaixa com o board, já que o Ás é a carta mais alta e compõe boa parte das combinações de mãos do nosso range de raise do UTG. Já o segundo bordo não encaixa tão bem com nosso range. Assim, se nosso adversário tiver algum par ou mão especulativa, teremos dificuldades em fazê-lo acreditar no nosso enredo, que nesse caso é o de que temos um overpair ou mãos fortes. É muito mais fácil fazer o oponente largar essas mãos no primeiro bordo, já que geralmente teremos muitos Ases no range.

Ser um bom contador de histórias é parte essencial de ser um jogador profissional de poker. E, para uma boa narrativa, cada detalhe importa. É necessário usar todos os indícios a seu favor, pensar e repensar enquanto analisa a mão. E exatamente quando temos o controle do que estamos representando, torna-se muito mais simples enxergar com clareza as histórias que os adversários estão procurando contar.

Treine à exaustão, converse com outros profissionais, tente assimilar e analisar suas histórias para saber se elas fazem sentido e produzem as reações desejadas. Afinal, para atingirmos nossos objetivos, precisamos ser plausíveis do começo ao fim, sem demonstrar furos ou sobressaltos que denunciem incoerências e pressa no roteiro. E são essas possíveis falhas que precisamos procurar ao nos depararmos com as mais diversas criações dos outros jogadores.

Afinal, assim como criamos histórias, somos também o alvo daquelas que nossos adversários representam o tempo todo. Para chegar ao nível dos grandes profissionais, precisamos fazer com que nossas histórias passem pelo crivo dos oponentes ao mesmo tempo em que somos avaliadores críticos e atentos das histórias que eles se esforçam para nos contar. Não só a experiência, mas o treino, o estudo e a atenção são essenciais para nos tornarmos bons contadores e astutos avaliadores. Quanto mais lemos e contamos histórias, melhores ficamos para criar a próxima.




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